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Discussão Pública na UFPR sobre o Projeto Future-se

Elaine Leal     5 de agosto de 2019 - 7h03

Com um auditório lotado de representantes da comunidade universitária e da sociedade, a Universidade Federal do Paraná (UFPR) discutiu publicamente o Programa Future-se, do Ministério da Educação (MEC), na tarde desta quinta-feira. A ideia é que haja novos debates e articulações até que as propostas passem pelo Conselho Universitário antes de serem encaminhadas ao ministério. A consulta pública do MEC está aberta até 15 de agosto.

O reitor da UFPR, Ricardo Marcelo Fonseca, conduziu os trabalhos, nos moldes de audiência pública, e representantes de entidades internas e externas se posicionaram acerca do tema. Ele assegurou que esse não era o momento para dizer sim ou não à proposta do MEC, mas sim de “refletir e apresentar questões”, já que o projeto ainda irá tramitar e só depois de uma eventual aprovação será necessário optar pela adesão.

Reitor Ricardo Marcelo Fonseca conduz discussão. Foto: André Filgueira/Sucom-UFPR

O programa vem sendo alvo de reflexões desde que foi lançado, em julho. A vice-reitora, Graciela Bolzón de Muniz, havia realizado uma reunião extraordinária para capilarizar o debate sobre a proposta do MEC. Dias antes da discussão pública, a reitoria divulgou um edital, definindo as regras da reunião e abrindo espaço para que qualquer um pudesse enviar suas contribuições, mesmo por e-mail.

Para o reitor, o texto do projeto tem uma série de “silêncios eloquentes”. Entre esses lapsos, citou a falta de propostas sobre extensão, o desacoplamento de outras políticas previstas para a área, como o Plano Nacional da Educação, a negligência com as pesquisas das humanidades e ciência básica e a falta de discussão sobre o papel social da universidade quanto à inclusão. Além disso, ele destacou que o projeto não leva em conta as diferenças entre as várias universidades públicas do país.

Por meio de uma exposição detalhada, Fonseca citou problemas de aparente inconstitucionalidade no projeto, como a quebra do que prevê o artigo 207 sobre a autonomia universitária, com a possibilidade de compartilhar a gestão com as organizações sociais (OS). Este foi um entendimento recorrente entre os participantes da audiência, que veem a proposta com muitas dúvidas. “Não se fala nas fundações de apoio, que sofrem controle social externo e existem em função de apoio à universidade. As OS não sofrem esse controle”, explicou.

Além dos problemas de inconstitucionalidade, ele também levantou dúvidas sobre o projeto, como a falta de clareza com relação aos fundos de investimento, as diretrizes de política de pessoal e as cláusulas excessivamente abertas, que levam à imprecisão e consequente insegurança por parte das universidades em geral. O reitor se referiu às propostas como “tautológicas”, pois tentam trazer como novidades ações que a universidade já faz há muito tempo, como a defesa da inovação, do empreendedorismo e da internacionalização.

Em sua fala, citou, ainda, o que chamou de “receios e perigos”. Ele acredita que para algumas instituições o Future-se pode ter um efeito trágico, pois a universidade não deve ser apenas repositório de conhecimento aplicado. Segundo ele, há um risco de que o programa crie nichos, em que determinados setores sejam prósperos e outros modestos. A possibilidade de os hospitais universitários atenderem planos privados também é vista como um risco, já que a proposta pode confrontar a vocação e os interesses de atendimento público e gratuito via SUS nos hospitais universitários.

Apesar das críticas, Fonseca assegurou que não existe rejeição à proposta de parcerias com o setor produtivo e que a universidade está aberta a novas possibilidades de captação de recursos, desde que seja mantida a autonomia universitária.

Representantes expõem dúvidas e críticas ao projeto

Representantes e membros de onze instâncias diferentes foram convidados a se manifestar sobre o Future-se. As principais dúvidas se deram em torno da ameaça à autonomia universitária e, consequentemente ao seu caráter público, aos fundos de investimento propostos pelo MEC e à permissão para que as Organizações Sociais participem da gestão das universidades.

Falando como economista, o pró-reitor de Administração, Marco Cavalieri, apresentou dúvidas sobre os fundos de investimento, que para ele dificilmente serviriam para sustentar todas as universidades federais. Ele também criticou as comparações do modelo brasileiro com o australiano e americano, em que as famílias têm alta renda per capita, o que facilita o acesso ao ensino superior.

O advogado e professor Thiago Breus reforçou inconstitucionalidades do projeto. A possibilidade de o Ministério ser cotista de fundo de investimento foi classificada como ilegal, assim como a possibilidade de os departamentos estabelecerem sociedade com unidades mercantis. Ele também criticou a possibilidade de organizações sociais gerirem as instituições públicas, o que, segundo ele, não representaria nenhum ganho. Breus concluiu sua fala alertando que constatou 19 possíveis divergências legais, em apenas 25 artigos, no projeto do MEC.

Auditório lotado durante discussão pública. Estudantes participaram. Foto: André Filgueira

Antoninho Caron, da associação comercial do Paraná, falou em nome da comunidade externa. Ele reforçou o desejo de ver uma universidade “cada vez mais plural”, e garantiu que o setor produtivo está interessado em financiar “produtos e projetos de irradiação do saber”.

Já os advogados André Feoliloff, assessor jurídico da Fundação da Universidade Federal do Paraná (Funpar), e Claudia Kuroski, da Fundação de Pesquisas Florestais do Paraná (Fupef), destacaram o papel das fundações de se colocarem ao lado das universidades, para fortalecê-las e apoiá-las. Feoliloff afirmou que o Conselho Nacional das Fundações de Apoio às Instituições de Ensino Superior e de Pesquisa Científica e Tecnológica (Confies) tem trabalhado desde à aprovação do marco da Ciência e Tecnologia para fortalecer o acesso a novas fontes de recurso.

Duas representantes dos estudantes se posicionaram sobre o Future-se. Pelo Diretório Central (DCE), Ellyng Kenya Cordeiro criticou o MEC por tentar promover a “divisão da universidade”. Para ela, o projeto promove uma discriminação com as ciências humanas, além de ser um primeiro passo para a privatização. Luciane Leopoldo Belin, da Associação Nacional dos Pós-Graduandos (ANPG-UFPR), adotou o mesmo tom, e salientou a importância de se discutir o impacto do programa “nas verbas para pesquisa, bolsas e critérios de avaliação”.

O Movimento Livres também participou do debate. O coordenador estadual, Luis Lelis de Souza, e o coordenador de movimento estudantil, Lucas Almeida Franceschi, disseram defender a proposta de universidades mais independentes, desde que não haja substituição de capital público por privado. Eles salientaram que o Movimento Livre é liberal por natureza e contra a centralização de recursos e poder, como parece demonstrar o projeto Future-se.

Professores e funcionários adotam tom crítico 

O professor Paulo Vieira, representando a Associação de Professores da UFPR, ressaltou a importância de se dar uma resposta à altura, com uma contraproposta que mostre para o governo “o que é a universidade e o que é democracia”. O professor Paulo Opuska, também da APUFPR, pontuou que é preciso combater o projeto.

Para reitor, discussão pública foi plural. Foto: André Filgueira

Os docentes Marcos Ferraz, do Setor da Educação, e Marcos Wagner da Fonseca, das Ciências Sociais Aplicadas, falaram em nome dos diretores de setor. Para Ferraz, o Future-se não dialoga com as metas de inclusão aprovadas junto ao Plano Nacional de Educação. Fonseca levantou dúvidas sobre a constituição dos fundos e a gestão via OS. “Como inserir um agente externo para fazer uma co-gestão? Como ficam os conselhos?”, questionou.

Os representantes dos coordenadores de graduação e pós também expuseram suas dúvidas. A presidente do fórum dos coordenadores de graduação, professora Nilce Nazareno da Ponte, falou que o projeto não atende as necessidades e diferenças dos cursos de graduação. O professor Jairo Calderari, presidente do fórum dos coordenadores dos programas de pós-graduação, disse que o projeto pode produzir uma espécie de censura à pesquisa.

O servidor Daniel Mittelbach, em nome do Sindicato dos Trabalhadores em Educação das Instituições Federais de Ensino Superior no Estado do Paraná (Sinditest-PR), falou sobre a importância de não se dissociar o Future-se de um contexto amplo, de cortes no orçamento e quebra na autonomia. José Carlos Belotto, da Associação de Servidores da UFPR (Assufepar) criticou as lacunas da proposta, que deixam muitas brechas para regulamentações posteriores.

O reitor classificou a reunião como um sucesso. “O auditório lotado mostra que a discussão era ansiada pela comunidade acadêmica”. Ele destacou, ainda, a pluralidade de vozes, de lugares funcionais e ideológicos do debate. Como encaminhamento, sugeriu que os representantes continuem as discussões junto às bases para que outros encontros articulem o que será debatido pelo Conselho Universitário, nas próximas semanas.

A discussão pública foi transmitida ao vivo no Facebook e Youtube, sendo acessada por mais de 150 e 370 usuários, respectivamente. Num panorama geral, apenas no Facebook foram 3.900 visualizações, com o registro de alcance de 13.276 pessoas. No Youtube a reunião na íntegra já teve mais de 2 mil visualizações.

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